Das histórias que mais me marcaram no futebol passaram-se com um treinador que tive no Portimonense, o Paulo Roberto, com quem vivi alguns episódios engraçados. Foi o treinador que a meio de uma discussão com o Cadorin lhe deu uma cadeirada. Só para que vejam a peça.
Tenho uma história que me marcou logo ao início. Quando o Benfica comprou o Pacheco e o Augusto ao Portimonense, eu e o César Brito fomos emprestados. Chegámos já com a pré-época a decorrer e, pela forma como ele me recebeu, percebi que o negócio foi feito à sua revelia. Quando lá chego, logo na apresentação aos meus colegas, que já estavam a treinar há algum tempo, ele reúne a malta no meio do campo e diz-lhes com aquele sotaque brasileiro:
– Este rapaz é o José Carlos, vai ser vosso colega.
De repente, vira-se para mim:
– Mas olha, ó cara, você não pense que chega aqui e é o melhor. Você não é bom, não. Se fosse fosse bom estava lá. Você é uma merda, por isso é que ‘tá aqui!
Tinha 19 ou 20 anos, quase que chorei, ou chorei, já nem sei, mas se pudesse tinha vindo logo imediatamente para Lisboa. Foi a forma como fui recebido no Portimonense por este treinador.
Ele tinha já um defesa direito em quem confiava, um rapaz da terra que era o Fernando, era o preferido dele, e é natural que tenha havido também alguma pressão por parte da Direcção para ele me pôr a jogar, então fez-me a vida negra. Nunca fui titular durante a pré-época, fui sempre suplente até ao primeiro jogo do campeonato, depois a partir daí joguei sempre a titular durante dois anos. Ele esteve lá três meses a contar com a pré-época, fizemos para aí quatro jogos com ele. Ganhámos um, perdemos os outros e ele foi-se embora. Mas durante todo o tempo que lá esteve quando passava por mim eu cumprimentava-o com um “olá, mister” e ele dizia-me:
– Jogadorzinho do director…
Os treinos dele eram duríssimos. Eram de morrer mesmo, levávamos muitas tareias. E eram sempre de manhã e à tarde. Normalmente a gente treinava, almoçávamos juntos num restaurante lá perto, éramos 10 ou 12 jogadores que ainda não tínhamos casa, a malta que era de fora, e para fazer a digestão costumávamos dar uma voltinha ali pela rua das lojas lá de Portimão. Com muita dificuldade em andar, andávamos cheios de dores, as pré-épocas são assim, e logo no início íamos nessa rua e cruzámo-nos com ele em sentido contrário. O gajo era enorme, era um bicho! Ele era polícia lá no Brasil. De repente passa por nós.
– Olá, mister! Boa tarde.
– Boa tarde? Boa tarde uma merda! Não estão cansados, não?
– Mister, viemos só dar uma voltinha para fazer a digestão.
– ‘Tá bem, ‘tá bem.
Nesse treino da tarde espeta-nos com uma coça daquelas valentes. E levou a tarde toda nisto:
– Então? Estão cansados? Querem passear na rua das lojas e ir ver as meninas, seus filhos da puta?
Era assim que ele nos tratava.
– Não vem dizer que ‘tá cansado, não! Se estivesse cansado não ia passear na rua das lojas e ver as meninas, ia para casa descansar. Vamo’, corre aí!
Ele era horrível, do pior! Havia lá um miúdo, era o primeiro ano de sénior dele, o Humberto, um defesa central. Um dia atrasou-se e a gente já estava a treinar. Ele entra e o mister fez-lhe sinal para correr à volta do campo. E ele pensou que era para aquecer para depois entrar no treino. Correu 5, correu 10, correu 20 minutos, até que para aí ao fim de meia-hora apontou para o relógio e perguntou-lhe:
– Mister, está bom? Até quando?
– Até quando? Até morrer, filho da puta! Quer chegar atrasado para dormir, não é? Agora corre aí!
E passou o treino todo a correr à volta do campo. Até tínhamos medo de falar com ele, ele era demais! Tinha outra coisa engraçada. Se por acaso havia dois ou três jogadores lesionados, que não estavam a treinar e ficavam ali de fora a ver, ou então quando estavam a correr à volta do campo, o que é que ele fazia? Metia a malta a correr separada.
– Tu corre para ali e tu para ali. Quer falar mal do treinador, filho da puta? Não está aqui para falar, está aqui para trabalhar! Não quero ver ninguém junto.
E com os lesionados que queriam estar no banco a ver o treino era a mesma coisa. Então metia um numa bancada, outro na bancada atrás da baliza, ficava tudo separado. Se quisessem ver o treino tinha de ser assim.
Não assisti à cena com o Cadorin, foi antes de eu chegar a Portimão. Ele pegou na equipa no final da época anterior e safou o Portimonense. E acho que uma vez disse qualquer coisa numa palestra, o Cadorin também era tramado e não gostou, então levantou-se e deu-lhe com a cadeira. Ele dizia-nos mesmo:
– Se tem de dizer alguma coisa na minha cara não tem problema, ouviu? Se quiser ir no tapa eu vou no tapa, não tenho medo de ninguém! E se quiser ir no tiro eu também vou no tiro! Tenho uma arma em casa, a gente marca local e hora e vamo’ no tiro!
Regressou ao Benfica e jogou ainda no E. Amadora, V. Guimarães, Belenenses e terminou no Atlético, em 2003. É presidente da APJA, vice-presidente do SJPF e comentador da SportTV.
Grande José Carlos é da minha Infância sempre Menino Hoje Homem com um comportamento Brilhante. Grande Abraço.
Grande miúdo este Zé Carlos. Fomos colegas de liceu, ele já era uma vedeta e foi sempre humilde e correcto. A alcunha dele era Carolas. Não o vejo há anos mas gosto muito dele.
Se calhar tinha a escola do yuastric antigo treinador do FC Porto , e era assim que o Porto precisava de um treinador para pôr aquela cambada a trabalhar no duro.