Em todos os clubes estrangeiros onde joguei vivi situações meio caricatas. Quando estive na Moldávia, depois de um jogo da Liga dos Campeões, o dono do Sheriff foi falar ao balneário. Havia o presidente do clube, que estava lá todos os dias, e havia o dono, que ainda não tinha conhecido e aparecia lá de vez em quando, sobretudo nos jogos mais importantes.
E depois desse jogo de qualificação para a Liga dos Campeões ele apareceu para dar uma palavra de incentivo ao pessoal mas tinha um hábito curioso, que era colocar a pistola em cima da mesa quando se sentava. Não fazia ideia e quando vi aquilo pensei: “ui, o que é que se passa aqui?!”. Fiquei um bocado surpreendido a olhar para aquilo. Depois de ele sair perguntei aos meus colegas brasileiros, que já estavam há algum tempo no clube, se aquilo era normal e eles disseram que sim. Apesar de o país ter uma taxa de criminalidade de zero por cento, ele andava sempre armado. Ele gostava de virar a cadeira e sentar-se com os braços em cima das costas da cadeira e punha a pistola em cima da mesa. Mas falava sempre normalmente, nunca em tom ameaçador nem nada do género, só que tinha aquele hábito. E falava em russo. Nós tínhamos sempre uma tradutora ao lado por isso percebíamos tudo o que ele dizia.
Tenho outra história na Moldávia. Fomos jogar contra um clube de uma cidade muito pobre, onde o ordenado mínimo é de 60 euros. Era um campo sintético, jogo de campeonato, e os bancos eram mesmo junto à bancada. A certa altura olho para o meu banco de suplentes e vejo um corpo estranho. Olho novamente, com mais olhos de ver, então tínhamos um polícia sentado no nosso banco como se fosse um jogador. Aquilo até era tranquilo, mas sentou-se ali para não haver atritos entre os adeptos contrários e o nosso banco.
Na Roménia tenho duas histórias engraçadas. A primeira foi pouco tempo depois de chegar. Estava a vestir-me para ir treinar o os meus colegas disseram-me: “Não te equipes porque não vai haver treino”. Perguntei porquê e explicaram-me que como tinham salários em atraso queriam primeiro falar com o presidente. Entretanto ele lá chegou, reuniram e ele disse: “Não vos vou pagar os salários porque se o fizer vocês vão relaxar e sair do primeiro lugar”. Assim, naturalmente. Fiquei a pensar: “Se ele não paga agora que está em primeiro, quando é que vai pagar? Quando estivermos em quarto ou em quinto? Onde é que eu me vim meter?”. Achei aquela justificação um pouco surreal.
A outra foi quando estávamos a treinar no centro de estágios onde treina a selecção da Roménia, porque a nossa cidade, Giurgiu, ficava a uma hora de Bucareste e, como os jogadores viviam todos em Bucareste, muitas vezes treinávamos lá. Estávamos a treinar e começámos a ver muita gente a assistir ao treino e achámos estranho porque não eram jornalistas. Então o que era? O clube tinha uma empresa à qual alugava os carros que dava aos jogadores e, como também estava em atraso com essa empresa, não lhes pagavam há quase um ano, eles foram lá para ir buscar os carros aos jogadores. Os romenos tinham carro próprio mas os estrangeiros andavam com carros dessa empresa. Quando acabou o treino, o pessoal dessa empresa foi recolher as nossas chaves para levar os carros e nós, os estrangeiros, tudo de necessaire debaixo do braço a ir de metro para casa! Foi engraçado. No meio de Bucareste a ir de metro para casa porque foram-nos buscar os carros…
Na Bélgica, a única coisa assim diferente foi a pré-época. Aquilo é pior que o serviço militar! Foi uma pré-época dura, sempre com actividades, sempre a correr no meio da montanha e isso. De manhã fazíamos sempre uma actividade e à tarde treinávamos no campo. Todas as manhãs, para aí às 8 da manhã, começávamos. Uma das actividades era irmos correr na montanha, por equipas, até ao cimo da montanha. Aí, cada grupo tinha de pegar num tronco de uma árvore e levá-lo em ombros até a um rio. Aquilo cheio de pedras lá em baixo, nós com ténis, todos vestidos, a acabar no meio do rio com a água a dar-nos pela cintura. Só aí é que acabava a actividade e ganhava o grupo que chegasse primeiro com o tronco à água.
Também tivemos outra actividade engraçada. De manhã fizemos escalada na montanha e acabámos a descer em slide. À tarde fomos treinar para o campo e estávamos muito cansados. Mas pronto, depois era jantar e ir descansar. Mas depois de jantar o treinador deu um mapa ao capitão. Fomos para o meio do mato, tudo escuro e tínhamos de descobrir o regresso para o hotel. Levávamos lanternas, o capitão com o mapa e para aí a um quilómetro do hotel tínhamos de passar uma vedação com arame farpado e do outro lado estava um campo com vacas. E a malta estava toda com medo. “Então vamos passar aqui no meio? Se levarmos com uma vaca ficamos aqui estendidos no escuro. Quem é que nos acode aqui? Não se vê ninguém”. O caminho era só por ali, não havia outra hipótese. Então fomos devagarinho a passar no meio das vacas, de regresso ao hotel.
Foi uma coisa engraçada, numa pré-época muito dura, nunca tinha apanhado nenhuma assim, mas o espírito de grupo acabou por vir ao de cima.
O lateral do Tondela teve passagens por clubes como Sporting ou SC Braga, além das experiências no estrangeiro no Sheriff (Moldávia), Astra Giurgiu (Roménia) e Kortrijk (Holanda).