Tinha eu 14 anos quando a minha família se mudou para a Av. São João de Deus, ali às avenidas novas, em Lisboa. Acabado de chegar da Covilhã, belo sítio para nascer com a força nas pernas necessária à prática desportiva visto que é sempre a subir ou sempre a descer.
Era o futebol o grande facilitador da minha integração junto dos novos amigos da segunda infância. Deveríamos ser para aí uns vinte e cinco rapazes quando fomos jogar ao Sporting numa daquelas sessões de prospecção que os clubes fazem, ou faziam.
Na distribuição do pessoal apressei-me aos lugares de avançado, isto porque marcava golos naturalmente. O mister Osvaldo Silva, um tipo afável de boa lembrança, dirigia o jogo e ia mudando as posições a seu belo prazer enquanto o pessoal se esfalfava dando o seu melhor. Pegou em mim fazendo-me recuar ao meio-campo, depois deslocou-me para a direita e posteriormente para o corredor esquerdo. Andei por todo o lado sem parar e sempre a jogar. No final do treino algo caótico e quando nos encaminhávamos para o balneário, o mister pegou-me no braço, puxou-me para o lado e disparou: “Fala com o teu pai. Se ele deixar podes ser jogador do Sporting. Podes vir a ser um grande defesa esquerdo.”
Aquilo bateu na minha indiferença. Primeiro, gostava de jogar à frente, destro no remate apesar de usar bem o pé esquerdo, e depois o meu coração batia em vermelho. Enfim… Chego a casa e digo sem grande entusiasmo ao meu pai que o Sporting me queria lá ao que ele me respondeu em rajada mortífera: “Filho, deixa lá isso. Vai estudar.” Ele sim, sportinguista dos quatro costados. Encolhi os ombros e não fiz questão, o meu futuro teria balizas e relvados bem diferentes.
Só uns anos mais tarde entendi o alcance das palavras de Osvaldo Silva. Tinha de facto um poder de explosão e arranque fantásticos, cruzava bem e, acima de tudo, jogava de cabeça levantada, condições básicas para ter uma leitura de jogo e uma boa performance dentro do campo. Deixo agora o meu abraço e a minha vénia a Osvaldo Silva, pessoa afável que um dia fez subir a minha auto estima a valores elevadíssimos.
Ao longo de quatro décadas integrou grupos emblemáticos como o Trovante, Ala dos Namorados, Rio Grande, Cabeças no Ar ou Filarmónica Gil, numa carreira que dispensa mais apresentações.