João Carlos Cunha

Um dos dias de bola que mais me marcou foi o dia 14 de Dezembro de 1986. Era perto do Natal, mas já na altura o país quase parava para assistir ao maior dérbi do futebol português. O Sporting recebia o Benfica, num estádio com quase 75 mil pessoas e com uma mancha vermelha que pontuava o verde e branco das camisolas, bandeiras, fumos e cachecóis dos sportinguistas. Estava lindo, o antigo Estádio José de Alvalade.
Fui, como ia sempre, com o meu padrinho, que cedo me resgatou de uma casa onde se nascia benfiquista. Era grande a excitação de um puto de 11 anos naquela bancada mesmo por cima da Juve Leo. O Damas, o Mário Jorge, o Litos, o Oceano e o grande Manuel Fernandes, lá estavam todos preparados para ganhar um jogo que vale sempre mais que os pontos ou títulos que estejam em disputa.
No início do jogo, sportinguistas e benfiquistas estavam unidos num desejo comum, ganhar. Ninguém se importava que fosse por um golo, num erro, ou numa jogada de génio, ninguém se importaria muito com a forma se o resultado nos levasse para casa com o peito cheio de ganhar!
O Mário Jorge arranjou maneira de fazer o 1-0 e deixar os sportinguistas com meio caminho feito, e a maior parte do estádio a torcer para que pelo menos nos aguentássemos assim até ao intervalo. A mancha vermelha na bancada Norte ia alimentando a esperança na reviravolta e iam cantando para afastar o frio do cimento das bancadas. Na segunda parte foram com certeza os melhores 45 minutos das minha memórias futebolísticas. O show do Rei Manel começa aos 50 minutos e tem mais três actos até ao final do jogo. O Manuel Fernandes só via a baliza. Só queria marcar e cada bola nos pés era mais uma oportunidade para saltarmos com um “GOLOOO” que trespassava as bancadas do estádio.
7-1. Sete golos. Sete explosões que foram enchendo os sportinguistas de uma felicidade que incendiava as bancadas. Os corações dos sportinguistas explodiam a cada golo, a incerteza diluía-se de cada vez que o Silvino, cabisbaixo, ia buscar a bola dentro da baliza.
Uma tarde fria e chuvosa de Dezembro tornou-se no mais tropical momento de fervor sportinguista. Enquanto a maioria no estádio exultava a cada momento do show Manuel Fernandes, a mancha vermelha transformava o vermelho e branco dos cachecóis, bandeiras e cartões de sócio em pequenas fogueiras ateadas para amenizar o gelo da humilhação sentida pelos adeptos do clube da Luz. Uma bancada que se esvaziava deixando para trás pequenas fogueiras onde ardia uma mistura de vergonha com tristeza e que não foram suficientes para queimar as minhas memórias do dia do 7-1.


É conhecido como O Humorista e a SIC Radical até já passou uma série sobre ele. Ultimamente tem maravilhado audiências com Sexo ao Vivo, o seu mais recente espectáculo. Facebooktwitterlinkedinmail

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3 comentários sobre “João Carlos Cunha

  1. Aliás o Benfica nesse ano fez a dobradinha, eliminando o Sporting na taça. Sporting esse que ficou em 4º no campeonato

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