Ali estava eu, trajado a rigor, a festejar com centenas de pessoas num estádio que já havia visto melhores dias. Mas aquele não era o estádio em que eu queria estar.
Era a bênção das pastas (ou queima das fitas), a cerimónia que todos os anos, em Maio, coroa com pompa e circunstância o percurso académico daqueles que findam as licenciaturas. Na Universidade do Algarve manda a tradição que essa cerimónia seja no mítico Estádio de São Luís, casa do rival Farense. Rival porque, apesar de vestir as mesmas cores que o clube de Faro (o preto e branco), torço fervorosamente pelo barlaventino Portimonense Sporting Clube.
A minha família havia marcado presença na cerimónia. Juntamente com as famílias dos demais, deram àquelas bancadas uma vida que o clube anfitrião (na altura a disputar o CNS) só veio a superar à medida que o sonho do regresso aos campeonatos profissionais se foi materializando. É uma pena que um estádio daqueles só encha nestas ocasiões ou quando lá joga um dos 3 estarolas — como, de resto, acontece um pouco por todo o país, inclusive em Portimão, para minha tristeza.
O padre — ou o bispo, lembro-me cá! — dizia o que tinha a dizer sob um sol escaldante, daqueles que, em Maio, só o Algarve dá. Quando não se é religioso (já lá vai o tempo…), os trâmites religiosos parecem-nos sempre demasiado longos. Mas para mim, naquele dia, uma eternidade em câmara lenta era um eufemismo demasiado brando para descrever aquilo. À mesma hora, em Oliveira de Azeméis, jogava-se a última jornada do campeonato. Oliveirense – Portimonense, no Estádio Carlos Osório. A vitória punha o clube do meu coração novamente no principal escalão após uma travessia no deserto de 20 anos. Como nasci em 1989, não assisti aos anos de ouro do meu clube, nas décadas de 70 e 80. Portanto, aquele era um jogo especial para mim, era história a escrever-se. Era o jogo da subida.
A esmagadora maioria das pessoas (inclusive a minha família) estava atenta à missa, aos cânticos, aos salmos. Eu, sentado na relva junto à minha turma, estava com os ouvidos colados ao rádio a ouvir o relato. É possível que um grito meu tenha violado o silêncio daquele estádio quando, em Oliveira de Azeméis, Wilson Eduardo (esse mesmo!) marcou O golo, após passe de Yero com o ombro. Até final da partida foi sofrer, como sofre sempre quem adora o Portimonense. Longos minutos depois soou o apito final. Estávamos de volta à Primeira Liga.
E ali estava eu. Afinal não estava trajado a rigor (não envergava a camisola alvinegra); afinal estava a festejar sozinho; e afinal estava num estádio que viu um dos melhores dias da minha vida. Mas aquele não era o estádio em que eu queria estar.
Em 2010 criou no YouTube o canal Môce dum Cabréste. Dois anos depois começou a actuar ao vivo e os seus 163 centímetros juntaram-se ao sotaque algarvio cerrado como suas imagens de marca.