No Benfica tínhamos um jogador com a mania que era o Michael Jackson. Esse jogador era o Neno e todos os dias, antes do treino, nós tínhamos sempre um show dado por ele. Já tinha a cor do Michael Jackson, um bocadinho mais escuro, o cabelo também, e então como ele usava sempre umas calças justas pretas para treino, enfiava depois por cima umas cuecas brancas, punha uma fita à volta da cabeça, que era uma meia, e começava a imitar o Michael Jackson. Depois o pessoal ajudava ali com a bateria, batíamos nos cacifos. Aquilo só visto, porque contado ninguém acredita!
Nessa altura, o treinador era o Artur Jorge, que estava sempre no gabinete dele e entrava de rompante no balneário para cumprimentar todos os jogadores, um a um, com um aperto de mão. Uma vez entrou de rompante e o Neno, que estava de pé em cima de onde a gente se senta, saltou e sentou-se, mas ainda estava equipado à Michael Jackson. O Artur Jorge olhou e não disse nada porque ele estava sossegado. Cumprimentou-nos e fomos para o treino.
No dia seguinte aconteceu a mesma coisa e nós, para evitar que o Artur Jorge nos cumprimentasse um a um em vez de dizer bom dia a todos, que era muito mais fácil, pusemos os cestos do nosso equipamento um bocadinho mais afastados, e ele, para nos cumprimentar, tinha de se esticar todo. Esticou-se com o primeiro e teve de ser tanto que chateou-se e foi-se embora. Foi uma risota de todo o tamanho! Queríamos livrar-nos do cumprimento dele mas era uma brincadeira, nunca pensámos que levasse aquilo a mal. E pronto, no dia a seguir lá estava o Neno outra vez. Até trazíamos um gravador com música e ajudávamos o Neno. Aquilo fazia-nos bem, até íamos com outra disposição para o treino.
O Neno tem jeito para cantar e o cantor predilecto dele é o Julio Iglesias. Uma vez fomos jogar a Génova, estava um sujeito a tocar piano no hotel e pedimos-lhe para tocar uma música do Julio Iglesias para o Neno cantar. Ele fez esse favor, o Neno começou a cantar, só que entretanto chegou o treinador, o Mortimore, que viu aquilo e perguntou-lhe: “Quer ir já para Lisboa?”
Nos treinos era a mesma coisa. O Neno estava sempre a cantar e ele perguntava-lhe se queria sair. O Neno era uma alegria antes, durante e depois, era sempre assim, só que o Mortimore não gostava disso. Com o Mortimore tinha de ser tudo direitinho, não se podia fazer barulho, não se podia fazer nada. Era a maneira dele ser, só que o Neno não conseguia, não se aguentava. Às vezes íamos muito cedo para o treino, uns iam fazer massagens ou qualquer coisa, e então tínhamos um espectáculo antes do treino e já íamos a cantar pelas escadas até entrar para o relvado. De facto, o Neno era a alegria daquela casa.
Em 1980 assinou pelo Benfica após duas épocas em bom plano no Beira-Mar. Realizou 535 jogos pelos encarnados, sendo apenas superado por Nené.
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