Carlos Saavedra

Passei uns meses caricatos na Grécia. Tinha saído do Chipre, porque tinha havido lá uma confusão por causa dos bancos fecharem, aquilo estava mal e quis ir-me embora. Depois, um jogador que tinha jogado comigo no Chipre e tinha ido para a Grécia, para uma equipa da Segunda Divisão, ligou-me a dizer que precisavam de um jogador para a minha posição e queria saber se estava interessado. Isto foi num domingo, falei com o meu empresário e na segunda viajei para a Grécia. Foi tudo muito rápido.
Perguntei a esse meu antigo colega como era com a viagem e ele disse-me:
– Compra tu a viagem que a gente depois dá-te o dinheiro.
Comprei a viagem, segunda-feira chego à Grécia e não havia ninguém no aeroporto à minha espera. Passado para aí uma hora ligo para o empresário e disse-me que ia um taxista buscar-me. Assim foi. Chego ao hotel e estava o empresário à minha espera. Disse-me que no dia seguinte tínhamos de viajar para as montanhas porque a equipa estava a estagiar lá. Também me disse que tinha de fazer exames médicos no dia a seguir, mas nem os fiz.
Chegámos às montanhas e estavam lá uns 30 jogadores. Tudo com a roupa que levava de casa, nem havia fatos de treino nem nada. E isto Segunda Liga! Chegámos uns sete jogadores e foram-se embora uns dez.
Estivemos lá uma semana e voltámos para Atenas porque tínhamos um jogo para a taça nesse fim-de-semana. Na Grécia primeiro começa a taça e depois é que vem o campeonato. O treinador passou toda a semana a treinar uma equipa e, quando chegámos ao dia do jogo, seis jogadores não estavam inscritos! Ele teve de mudar a equipa toda e perdemos esse jogo.
O campeonato começava na semana a seguir e íamos jogar fora de Atenas. Era uma viagem muito longa, de quatro ou cinco horas, e íamos no dia anterior. Como íamos de véspera depois treinávamos lá, num campo que eles depois arranjavam. Quando estamos a chegar ao campo, os jogadores disseram ao treinador e ao director que ia connosco que o campo estava fechado.
– Não há problema. A gente salta o muro.
Saltámos o muro e treinámos num campo no qual nem pediram autorização para treinar lá. Treinámos e fomos para o hotel. Jogámos, voltámos para Atenas e quando chegámos ao hotel não nos deixaram ficar lá porque o clube não pagava. Tivemos de pegar nas nossas coisas, chamámos táxis e fomos para outro hotel. Chegámos lá e também não nos deixaram ficar porque já sabiam que o clube não pagava! Só ao quarto ou quinto hotel que tentámos em Atenas é que nos deixaram lá ficar. Durante a semana, pediam-nos para irmos de táxi para os treinos, o campo ficava a uma hora e tal do hotel, porque não arranjavam um autocarro. Era tudo assim.
Houve um jogo, à terceira jornada, em que estávamos no hotel, o mister deu a palestra e fomos para o autocarro, tudo com muita pressa. Entrámos no autocarro e o motorista parecia que estava num rali! O pessoal intrigado, “mas este gajo está maluco? O que é que se passa?!”. Depois percebemos: o jogo era às três da tarde e chegámos ao campo às 14h45. Equipámo-nos à pressa, aquecemos a correr e lá fomos para o jogo. Mas foi todo o tempo que lá passei assim! Incrível!
Fui em julho e não me pagaram um único ordenado. Nem a viagem de avião me pagaram! E os jogadores estavam a pedir dinheiro, dizíamos que assim não continuávamos a jogar, e o director ainda pensava que tinha razão e dizia que se queríamos receber tínhamos de jogar. Até que chegou um dia, íamos jogar fora, em que lhe disse:
– Você já viu um carro andar sem gasolina? Assim também não ando. Se não me pagar, não jogo! Não vou estar aqui longe da minha família sem receber ordenado.
O que é que aconteceu? Meteu-me fora do hotel! Meteu-me na rua. Tive de ir para casa de um jogador grego, que me deixou ficar lá. Repito: Segunda Liga da Grécia! Ainda falam do futebol português….
Mas foi o tempo todo assim. A equipa não tinha dinheiro, tínhamos para aí 15 jogadores a viver num hotel e eles sem pagar, só podiam ter quatro estrangeiros e eles tinham dez…. Era uma confusão. Depois meti o clube em tribunal e vim-me embora.
Quando me ligaram era um cenário bem diferente. Tinham descido umas equipas por causa de resultados combinados, então tiveram de subir outras, ou seja, esta equipa para onde fui era da Terceira Divisão e passou para a Segunda. E como era em Atenas, disseram-me que o Olympiacos e o Panathinaikos iam ajudar essa equipa, iam meter lá jogadores e dinheiro para os ajudarem a subir à Primeira. Mas foi tudo mentira, a equipa não tinha nada. A equipa não tinha sede, não tinha campo para treinar, não tinha nada! Zero. Era incrível.
Muitas vezes ia para os treinos de metro, hoje treinávamos num campo e amanhã noutro, também não nos deixaram treinar noutro campo porque não pagavam…. Chegou a uma altura em que não dava mais e vim-me embora.


Além dos meses passados nos gregos do Glyfada, o experiente médio do Sacavenense teve também uma passagem pelo Chipre, onde representou DOXA, Ermis Aradippou e Nea Salamis. Facebooktwitterlinkedinmail

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